Júnia Mariza

Gosto de comédias românticas, livros com incríveis histórias de amor. Se algum dos personagens tiver uma doença em estado terminal então eu apaixono. Choro o filme/livro todo e isso me deixa em paz. Escuto Engenheiros, Pitty, Nando Reis, Projota, Andrea Bocelli, Hillsong, Rosa de Saron, Anitta, Shakira, mas quando a tristeza aperta tem que ser Jorge e Mateus. Meu celular está sempre no silencioso, mas quando vou à capela ele misteriosamente vibra incomodando todo mundo. Minha cor preferida é azul. Ou era, hoje não sei mais. Não tenho tempo para nada, nunca. Tenho uns mil livros salvos no celular, talvez algum dia eu encontre tempo para eles. Já fazem três meses que estou lutando com um ponto-cruz. Quando era criança amava, mas hoje falta coragem (que chamo de tempo). Estou fazendo uma dieta. No ano passado eu precisava perder 03 quilos. Agora faltam apenas 05 quilos. Acontece que não consigo ficar sem açúcar. Aprendi com minha avó colocar três balas de uma vez dentro da boca, menos que isso não me satisfaz. Na TPM então, posso ingerir mais de 10 quilos de açúcar por segundo. Passo muito tempo falando que tenho que estudar, é o único jeito de pobre mudar de vida. Depois de 10 anos falando isso estou aceitando que a vida de pobre pode ser mais feliz. Levanto de mau humor. Demoro uns 30 minutos para realmente acordar. Levanto, acordo a criança, tomo banho e então, depois do primeiro gole de café posso estar acordando. Antes desse momento não é recomendado tentar qualquer aproximação. Sou muito chata e tem dias que estou insuportável. Pode ser curado com um chocolate dependendo do grau de chatisse. Se brigar ou gritar comigo eu choro. Sou um bebê que assusta com ruídos. Sempre tenho razão. Se tentar me contrariar introduzirei argumentos infundados e provas irrefutáveis. Fico fascinada por livros de economia financeira. Sempre leio, mesmo sabendo que depois ficarei arrasada ao perceber que não vou conseguir meu primeiro milhão guardando R$100,00 por mês. Não conseguirei a chave para minha tão sonhada liberdade financeira. Perdi meu tempo com essa baboseira toda e ainda corro o risco de cair numa depressão profunda. Estou sempre inventando um curso para fazer. Não sei se isso vale a pena. Eu quero aprender falar outras línguas para facilitar minha vida quando acertar os números da mega-sena. Vai que um dia eu acerto. Não consigo fingir que gosto de uma pessoa. Minhas feições não conseguem esconder o descontentamento. Um dia ganhei um diário com cadeado que não trancava nada. Ele era tão bonito, que não conseguia parar de escrever...e até hoje não consigo. Espero não entediá-los com meus pensamentos!

sábado, 29 de maio de 2021

Diário de Quarentena

 

O MARIDO

Uma semana em casa. Uma longa semana em casa. Se a mulher perceber que estou descansando arruma alguma coisa para perturbar.  A criança está inquieta, as aulas no formato on-line são horríveis. Os alunos não sabem o que fazer, os professores não sabem o que fazer, a mulher só grita tentando ensinar a lição, prefiro ausentar-me. A escola manda todos os dias intermináveis lições para provar que poderemos pagar as mensalidades tranquilamente porque mesmo em casa as crianças aprendem. A vida do adolescente não mudou muito porque só ficava trancado no quarto o dia inteiro. Fui participar de uma reunião de cueca, (essas intermináveis reuniões que poderiam ser reduzidas a um e-mail) e a criança no auge da inocência entrou no quarto e perguntou onde estava o resto da minha roupa. Infelizmente o microfone estava ligado e meus colegas tiveram uma crise de risos. Meu chefe permaneceu sério. Mas instintivamente sabíamos que estava passando pelas dificuldades, certa vez escutamos a esposa dele gritando no fundo.

Os clientes acreditam que trabalhando em casa não tenho direito a horário de almoço, descanso ou fim de semana. E a maioria acredita que não faço nada.

Estou inclinado a voltar para o escritório a fim de manter minha sanidade mental. O vírus não é nada perto da minha esposa. Espero que voltemos a rotina normal em pelo menos 40 dias.

 

 

A CRIANÇA

Estou feliz porque mamãe e papai estão em casa comigo, e agora não preciso mais ir para a escola. Mas a escola acredita que mesmo em meio uma pandemia é muito importante fazer dever de casa. Mas eu não aguento mais. Minha mãe perguntou quanto é dois e dois, quando eu disse vinte e dois ela começou a gritar como uma louca e disse que iria sumir. Eu escondi debaixo da mesa enquanto ela ficou gritando por quase uma hora. A professora queria me dar falta porque assisti aula com fantasia de Batman. Não tem graça ficar em casa. Papai passa o tempo todo com o celular. Se eu tentar entrar no quarto do adolescente serei expulso. O único que me entende é o cachorro.

 

O ADOLESCENTE

 

Só posso estar sendo castigado pelo fato que ter que conviver vinte e quatro horas por dia com essas pessoas que a sociedade chama de família. Eu vou surtar. Esse pirralho que não tem nada para fazer quer entrar no meu quarto para conversar. Eu nem gosto de conversar e não tenho mais idade para brincar. Ninguém nessa casa me compreende. O velho fica fingindo que está aqui, mas a alma dele tá no trabalho, ou então olhando mulheres na internet, escondido dela é claro. Até o cachorro está ficando louco. As vezes late como se fosse um lobo, bizarro. Os professores acham que não tenho nada mais interessante para fazer ao não ser lição de casa. Abro o link da aula em uma tela e um seriado na outra. Ninguém da casa sabe porque eu uso fone de ouvido. Não sou obrigado a estudar.

 

A MULHER

Achei que seria férias. Passar mais tempo em família, conversar, ter uma alimentação saudável. Mas a verdade é que trabalhar em casa é enlouquecedor. Tenho agora múltiplas tarefas. Acordar as crianças, preparar o café da manhã, já pensar no almoço. Limpar a casa porque é impossível concentrar com tanta bagunça, responder e-mail, protocolar processos. Já é hora do almoço. O homem da casa acha que não tenho nada para fazer porque além de tudo arrumou um cachorro pulguento para fazer companhia as crianças. Um maldito cachorro para fazer cocô, xixi, comer minhas plantas, estragar meus sapatos. Abri o portão para ver se o cachorro fugia, mas o miserável ficou imóvel. Agora estou lavando roupas todos os dias, passo álcool em gel em cada canto da casa, preciso vistoriar os meninos para lavar as mãos. Ajudar nas tarefas escolares, sou muito boa nisso. Mas quem mais dá trabalho em casa é o homem. Precisou ir ao supermercado porque os suprimentos estavam acabando. Quando chegou em casa largou os sapatos com possíveis contaminações na sala, não queria tirar a roupa da rua e colocar no cesto que deixei na garagem, disse que eu estava exagerando. Provavelmente encontrou conhecidos na rua e ainda pegou na mão. Não quer brincar com as crianças, não lembra de colocar comida pro pulguento. Não quer lavar as vasilhas. Tem profundas dificuldades de jogar embalagens na lata de lixo, ou de repor o papel higiênico. Consegue tirar a pasta dental do lugar, deixa cueca no banheiro e toalha na cama. Fica andando por aí com celular na mão fingindo que está trabalhando. Eu vou fingindo que acredito, mas já clonei o celular dele. E quando tiver uma prova de alguma sacanagem procuro um advogado que arranque até as cuecas dele no divórcio.

 

 

O CACHORRO

Eu estava perdido quando meu dono me encontrou. Ele me livrou de uma vida entediante. Meu dono é muito bom e me ama muito, me dá comida, água. Minha dona também me ama, inclusive colocou meu nome de Pulguento, fica o dia todo me chamando. Outro dia em retribuição ao seu amor ajudei ela com o jardim. Ela gostou tanto que ficou o dia todo falando meu nome. Ela faz umas expressões estranhas quando está feliz comigo.

Outro dia o portão estava aberto, fui na rua dar um passeio. Quando voltei estava fechado. Deitei e fiquei esperando alguém abrir o portão. Meu dono chegou e ficou bravo porque a mulher dele tinha aberto o portão para eu passear sozinho.

Tenho um amiguinho que brinca comigo o tempo todo. Aí minha dona chama ele para fazer obrigações. Não sei o que é isso, mas deve ser muito legal porque ele sempre vai correndo. Essa semana eu descobri que tem outra pessoa na casa, ele é o adolescente. Minha dona gritou para ele sair do quarto e quando saiu ele pisou no meu cocô. Ele não ficou bravo porque também me chamou de pulguento. Espero que eles fiquem comigo para sempre.

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